seta balanço janela

Raul Mourão

De 20 Set a 17 Nov 2018

Abertura: 20 de setembro

A LURIXS: tem o prazer de convidar a todos para visitar a exposição "seta balanço janela", de Raul Mourão.

De volta ao Rio, ainda mantendo ateliê em Nova Iorque, o artista realiza sua sétima exposição individual na Lurixs, a primeira no novo endereço no Leblon. A mostra ocupa a galeria térrea com três obras, realizadas em três diferentes linguagens – fotografia, escultura e pintura:

• a fotografia Setaderua / Joaquim Selva (225x150 cm) é um registro realizado em 2017 do mural feito pelo artista em frente a seu ateliê na Rua Joaquim Silva um ano antes, quando a cidade do Rio sediava os Jogos Olímpicos em 2016.

• a escultura é um grande balanço em aço corten, e dá prosseguimento às pesquisas do artista no campo das esculturas cinéticas;

• a pintura, medindo 200 x 400 cm, retorna a série das Janelas, protagonistas na exposição Fenestra (Lurixs, 2015), em escala, ainda não experimentada pelo artista.

Segundo o curador, promoveu-se um “estranho jogo de proporções”, no qual as três obras – seta balanço janela – “parecem desproporcionais em relação ao espaço”. Em vez de um retrato realista da cidade, buscou-se antes criar uma sensação: “a de que a cidade entrou pela galeria sem fazer a concessão de se miniaturizar”. Três outros trabalhos, também inéditos, estão expostos em espaços que gravitam em torno da sala principal. Resultados de pesquisas recentes do artista, são pequenas esculturas, baseadas no uso restrito de recursos materiais: aço, tijolo, vidro, pedra. Para Eucanaã Ferraz, a elegância expressiva dessa obras “faz lembrar a economia de um haicai; a geometria austera e serena remete a Volpi; a humildade formalmente rigorosa reporta-nos à poesia de Manuel Bandeira”. Ao usar a parede lateral da fachada para uma pequena obra, artista e curador propõem o avesso do que ocorre na sala principal. Assim, onde haveria lugar para uma grande escultura, um trabalho diminuto deixa livre o deck de entrada, integrando a rua, a calçada e a entrada da galeria. Segundo Eucanaã Ferraz, “trata-se de uma operação urbanística, sem dúvida, singela mas plena de sugestões, em total coerência com a obra de Raul Mourão, sempre atento à cidade e à sua ocupação espacial e simbólica”. Na noite de abertura, a fachada da galeria servirá de tela para a projeção de um vídeo realizado pelo artista, compreendendo uma colagem de outros vídeos, projetos, desenhos, esculturas, etc, uma espécie de fluxo ininterrupto das pesquisas que desembocaram na exposição. Durante o período da mostra, a galeria, aos sábados, promoverá conversas, debates, lançamentos e outras atividades organizadas por Raul e Eucanaã.

 

Sobre o artista

Inspirado pela paisagem urbana, Raul Mourão cria esculturas, pinturas, fotografias, vídeos, instalações e performances desde o final da década de 1980. Construídas com diversos materiais, suas obras transitam entre dois campos opostos: o ficcional e o documental. De um lado, estão as criações puras, concebidas a partir da fantasia; do outro, estão as obras nascidas das observações do real – a cidade, o futebol, a política ou os botequins.

Mourão ingressa na Escola de Artes Visuais (EAV) do Parque Lage em meados dos anos 1980. À época, o artista faz os primeiros registros fotográficos de um elemento urbano que seria mote de sua pesquisa nas décadas seguintes: as grades usadas para proteção, segurança e isolamento em ruas do Rio de Janeiro. Dos registros, surge a série Grades, sobre a paisagem urbana, que desemboca em trabalhos até os dias atuais.

Nos anos 2000, sua pesquisa toma novo caminho, o das esculturas cinéticas. Mourão passa a criar estruturas que podem ser acionadas pelo toque do espectador. As obras são exibidas em exposições individuais em instituições como o Museu de Arte Moderna (MAM) do Rio de Janeiro e o Bronx Museum, em Nova York, além de galerias em São Paulo, Rio e Salvador. Os trabalhos também integram coletivas no Canadá, em Portugal, nos Estados Unidos e na Inglaterra. 

Em 2013, o artista passa a viver em Nova York, onde realiza desenhos, fotos e videos, além de iniciar a série Janela/Window, de pinturas e esculturas cinéticas em aço corten. A nova série dá origem à exposição individual Fenestra, realizada na Lurixs em 2015.

Mourão também atua como curador e produtor de exposições, além de ter trabalhado na fundação e direção da galeria e produtora Agora, que funcionou na Lapa, nos anos 2000. Como editor, participa da criação das revistas O Carioca, Item e Jacaranda. Tem publicados os livros ARTEBRA (Casa da Palavra, 2005), MOV (Automatica, 2011) e Volume 1 (Automatica, 2015).

 

 

seta balanço janela | Eucanaã Ferraz

O título da exposição é explícito, ou ainda, expõe o que está exposto. Tudo está aí. Tudo é síntese. Tudo é 1. Tudo é 3.

A mostra examina vertentes poderosas – ideias fixas – do trabalho de Raul Mourão: setas , balanços , janelas . Uma espécie de retrospectiva, portanto, mas composta por obras inéditas, apenas 3, na sala principal da galeria. Eis a economia proposta por artista e curador: a materialização em pouco, muito pouco, do que é numeroso, complexo, dilatado. Um arranjo, portanto, oposto à saturação. Ou ainda, em vez de fluxo narrativo, a combinação e a síntese características da poesia. As ideias são fixas (e têm “serventia”, como escreveu João Cabral de Melo Neto) mas se desdobram em constante pesquisa, e ao longo de seus percursos singulares chegam, num certo momento, a formulações materiais que exigem a saída do ateliê: formas, volumes, potências reclamam o contato com o público, demandam novos sen􀆟dos, diálogos. Aqui estão, portanto, investigações em seus estágios de agora, mas que repercutem a memória de uma obra fascinante.

Em 1989, Raul Mourão começou a fotografar setas de sinalização de obras em ruas de várias cidades. Em 2001, passou a pintar setas, de modo que, descontextualizadas e livres de função, passaram a um estado de geometria bruta. Em 2016, no entanto, o artista fez as setas “retornarem” à rua, quando um longo muro defronte a seu ateliê, na Lapa, serviu‑lhe de suporte para uma pintura sequencial; a forma permanecia livre do utilitarismo de origem, mas saíra do isolamento geométrico para se repetir como um padrão. No ano seguinte, o que estava na rua “voltou” ao ateliê: o artista fotografou todo o muro que pintara, num total de 18 imagens que reconstituem toda a obra, marcada então pelo tempo e por intervenções aleatórias. É uma dessas fotografias que está em exposição agora.

As esculturas cinéticas – ou balanços – tornaram‑se protagonistas no conjunto da obra de Raul Mourão. Uma delas, em aço corten, impõe‑se na sala principal como a peça mais eloquente da experiência que propomos aqui: um estranho jogo de proporções, no qual as 3 obras – seta balanço janela – parecem desproporcionais em relação ao espaço. Desconsiderando as demandas de um retrato fiel do ambiente urbano, buscamos antes criar certa sensação: a de que a cidade entrou pela galeria sem fazer a concessão de se miniaturizar. Mas se o trio – seta balanço janela – dá a impressão de estar em desarmonia com a sala, decerto o olhar experimenta a ausência de conflitos entre os elementos do conjunto. Diante desses poucos fragmentos, reconhecemos uma paisagem – não literal, mas interpretada, que também nos vê, e que nos acolhe em sua estranheza.

Mas o grande balanço se “desdobra” em outros 3, expostos do lado de fora da galeria e nos espaços que gravitam em torno da sala principal. Na parede lateral da fachada, o jogo proposto parece ser o avesso daquele que se passa dentro, onde as obras parecem demasiado grandes para o ambiente; do lado de fora, onde haveria lugar para uma grande escultura, apenas uma obra de pequeníssima dimensão deixa livre o deck de entrada, integrando a rua, a calçada e a entrada da galeria. Trata‑se de uma operação urbanística, sem dúvida, singela mas plena de sugestões, em total coerência com a obra de Raul Mourão, sempre atento à cidade e à sua ocupação espacial e simbólica.

A escultura que se vê ali, notável em sua simplicidade, é um epilhamento de tijolos encimado por um balanço em aço, resultado das novas pesquisas do artista quanto a materiais, objetos e possibilidades cinéticas. O diálogo mais imediato da obra se dá com outra que, no interior da galeria, apresenta uma garrafa quase em estado de flutuação. Trata‑se do desenvolvimento da série apresentada na exposição In my opinion , na Plutschow Gallery, em Zurich (2017). Antes, garrafa e estrutura de aço constituíam os dois elementos formais da obra, que então repousava sobre alguma base. Agora, no entanto, tudo se tornou estrutura, objeto único, desenhado – Raul é um desenhista escultor tanto quanto um escultor desenhista – contra o plano vertical da parede. 

O terceiro balanço incorpora uma pedra. Mas a mineralidade aqui não se confunde com recusa ou agressividade. Antes, presa a uma estrutura pendular, a pedra nos faz um convite, oferece‑se ao nosso gesto. Tempo e natureza ao alcance de nossa mão. O que poderia ser mais generoso?

A elegância dessas obras, mínimas e expressivas em seu uso restrito de recursos materiais, faz lembrar a economia de um haicai; a geometria austera e serena remete a Volpi; a humildade formalmente rigorosa reporta‑nos à poesia de Manuel Bandeira. Para quem se acostumou às esculturas de grande tamanho de Raul Mourão, muitas vezes expostas em espaços públicos, e espera de suas obras mais uma resposta contundente à violência da experiência urbana contemporânea, é uma surpresa ver que a resposta permance, mas agora em direção contrária.

As janelas surgiram na obra de Raul Mourão a partir de 2014. Muito embora par􀆟ssem de procedimentos similares aos da monotipia, a imagem obtida não resultava do processo mais comum de pintar algo numa superfície para depois comprimi‑la com o papel. A técnica estava mais próxima do carimbo, mas não abdicava inteiramente dos procedimentos tradicionais da pintura, entre a abstração total e a sugestão figurativa. A pesquisa tomou vários rumos, expostos em diferentes momentos. Agora, a pintura assume sua força física e a tela, em dimensões ainda não experimentadas pelo artista, exibe sua potência material como suporte eficiente mas também como objeto pleno de história.

seta balanço janela – fotografia, escultura e pintura. Longos percursos, sim, mas aqui, como já foi dito, em vez de fluxo narrativo, a combinação e a síntese características da poesia.

 

Eucanaã Ferraz é poeta e professor de Literatura Brasileira na UFRJ. Publicou entre outros, Sentimental, ganhador do Prêmio Portugal Telecom de Melhor livro de poesia de 2012. Seus livros de poemas, oito ao todo, foram reunidos em 2016 em um único volume pela casa da Moeda/Imprensa Nacional de Lisboa. Também escreve poesia para crianças, e seu último livro, Cada coisa, de 2016, recebeu o prêmio de Melhor Livro de Poesia pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil. Organizou, entre outros, dois livros de Caetano Veloso, Letra só (2003) e O mundo não é chato (2005).