Palácio

Paulo Climachauska

De 09 Mai a 30 Jun 2005

Nos últimos anos, o trabalho de Paulo Climachauska se desenvolveu como um exercício picto-gráfico que consiste numa operação repetitória obsessiva que admite a persistência de uma estabilidade forçada devido a um cálculo de ocupação zonal executado sobre superfícies totalmente planas (fórmica, vidro transparente, paredes de museus), portando referências a um determinado estágio da auto-representação da arte brasileira no contexto do final da década de 90.

A disposição gráfica do trabalho apresentado na 26a Bienal de São Paulo consistia na projeção da imagem ?espelhada? do diagrama do próprio prédio da Bienal em escala 1:1. O artista buscava assim reiterar a apropriação simbólica da ?casa da arte?, como se a projeção especular do desenho abrangesse e contivesse a ameaça que existe em relação à sua permanência. Por isso, foi muito importante marcar o jogo da estabilidade através de uma linha formada pela sucessão encadeada de números, sempre procurando, entretanto, estabelecer relações de igualdade representacional entre a imagem e seu referente. Por meio desta operação, coloca-se o anseio da modernidade da arte brasileira em ser igual a si mesma: isto é, na medida de sua representação adequada.

O trabalho atual de subtração de Paulo Climachauska se propõe a delimitar, pela retração, a consecução de um excesso, fazendo uso, para isso, de uma tarja gráfica criada para reter a figura composta pela sucessão de números encadeados, cujo propósito não pode ser outro senão o de encobrir a impossibilidade de reter o excesso irrepresentável do real, não havendo excedente ao nível da imagem.

O cuidado em não ultrapassar o limite que, como atributo formal, define este trabalho, obriga ao rigor na execução da cadeia representável de fluxos que se anulam. Todavia, a operação de subtração deixa a marca gráfica de sua existência, produzindo uma espécie de grau zero de energia que atenta contra a idéia de uma possível filiação.

Neste terreno de extrema profilaxia visual, a filiação está colocada, essencialmente, tanto na representação das origens quanto na fixação dos vazios. A alguns metros de distância, o que se vê é uma linha difusa. Porém, ao nos aproximarmos, a nitidez dos algarismos nos aparece como a representação de uma sutura.

Em suma, aquilo que é impossível de ser alcançado no plano real da economia parece estar, pelo menos, configurado na representação paródica de sua possibilidade. A economia se ocupa do real, ao passo que a arte se ocupa somente do simbólico? Certamente que não, pois ?este? real se sustenta sobre uma economia simbólica que afeta a própria idéia de fetiche atribuída às mercadorias, aos bens de consumo. No terreno da visualidade, o rigor quanto ao excesso está ancorado ao temor da visibilidade ? não dos objetos, mas dos processos de reprodução.

Daí, a necessidade de enquadrar os algarismos como se, através desta manobra, fosse possível equilibrar o que não pode ser estabilizado. A grafia repetitória dos algarismos segue as linhas de algumas estruturas emblemáticas da arquitetura modernista brasileira. Apenas uma destas linhas formadas pela sucessão encadeada de contas de diminuir (grafada como uma tabuada escolar) reproduz o diagrama de uma perspectiva que se esgota na pulsão ornamental.

A obra apresentada na Bienal de São Paulo teria que ter a sua contraparte física. O que o trabalho de Paulo Climachauska ganhou em materialidade foi obtido através da subtração material da obra, que foi reduzida a fragmentos suscetíveis de serem trasladados e afixados em paredes, apenas para cumprir a exigência metodológica de se exibir a dimensão da redução no traslado. Esta é a medida radical de sua instância pompeiana que, por intermédio de um efeito de deslocamento, proporciona à visibilidade das ruínas a possibilidade de reconstruir lacunas na história.

Justo Pastor Mellado