De 04 Ago a 21 Set 2018
Abetura: 4 de agosto
A LURIXS: Arte Contemporânea tem o prazer de convidar a todos para a visitar primeira exposição individual do artista Gustavo Prado na galeria, disponível no 2º andar da galeria até o dia 15 de setembro de 2018.
Gustavo Prado vive e trabalha em Nova York, onde desenvolveu seus trabalhos apresentados na exposição, que toma lugar no segundo andar da galeria: pintura, fotografia, escultura e vídeo coabitam num ambiente onde a materialidade industrial do nosso tempo é observada através de uma série de encontros e desencontros – ou, como o título da exposição sugere, conluios e colisões. Prado apresenta nesta exposição obras inéditas. Usando materiais industriais conhecidos, lugares familiares e obras célebres da História da Arte, o artista cria seus trabalhos a partir do inesperado. “Gustavo experimenta as coisas que encontra no mundo guiado por suas ideias sobre arte, design, cidade e vida”, comenta o autor do texto da exposição, Fred Coelho. O espectador sente-se constantemente convidado a participar ativamente da obra de Gustavo, que funciona como um dispositivo de reconexão do observador com o mundo e seus objetos. A materialidade ganha então uma importância poética e chama o visitante para fazer parte dela: o reflexo de seus já conhecidos espelhos côncavos e convexos; o relevo das peças de lego, formando uma imagem perceptível apenas à distância; os carros entremeados que iludem pela semelhança – obras que se completam naquele que vê. Nas palavras de Fred, “Gustavo liberta nosso olhar para aquilo que podemos ver, mesmo quando não vemos”. “Colisão Conluio Colisão” fica em cartaz até 15 de setembro de 2018, de segunda a sexta, das 12 às 20h, e sábado, das 12 às 16h. Livre e grátis.
Sobre o artista
A obra de Gustavo Prado transita entre diferentes suportes - escultura, desenho, performance, fotografia e vídeo - para investigar as muitas possibilidades do espaço. O artista reside em Nova York, onde realiza grande parte de sua produção artística. Em 2002, o artista dá início a série Perceptible, cuja produção se estende até 2011. Nela, a experiência fenomenológica torna-se ponto crucial de uma investigação em ambientes construídos com lâmpadas fluorescentes, tecido, estruturas de metal e sensores de movimento, que, em conjunto, formam um sistema que suscita diversas respostas a partir do encontro entre o corpo e o espaço. Já em Trespass (2009), Prado usa um espelho portátil para projetar a intensa luz do verão no interior de diversos apartamentos, explorando as fronteiras do espaço privado. Os espelhos são também o principal material da série Measure of Dispersion (2014-2016), na qual o artista cria objetos a partir de estruturas de metal e diversos espelhos côncavos. O trabalho, em vez de fixar uma imagem única daquilo que está posicionado à frente, acaba por refletir um corpo fragmentado, alterando a percepção do espectador tanto de sua própria imagem quanto do contexto em que está inserido. Entre as exposições coletivas de que o artista participou, destacam-se Projéteis de Arte Contemporânea, na Funarte, Rio de Janeiro, em 2003, e Outros Lugares, no Espaço Cultural Casa das Onze Janelas, Belém, em 2006. Seu trabalho também foi apresentado no Le Carreau du Temple, em Paris, durante o Ano do Brasil na França, e integrou o programa Rumos, do Itaú Cultural, além de mostras no Museu de Arte Moderna (MAM) do Rio de Janeiro, e no Paço Imperial, também no Rio, entre outras. Prado participou de diversos projetos de residência artística, na Escola de Artes Visuais do Parque Lage e na New York School of Visual Arts, entre outras instituições. O artista vive e trabalha em Nova York.
Estranhos Familiares | Fred Coelho
Alguns anos atrás, Gustavo passou a fazer, através de sua conta do Instagram, um experimento estético. Morador de Nova Iorque há sete anos, o deslocamento cotidiano para o seu ateliê na região do Harlem tornou-se uma espécie de campo de experimentos visuais e conceituais. A série intitulada “Turrell do Harlem” (uma obra em hashtag) dava o tom de um percurso poético cuja exposição apresentada na Lurixs fornece uma síntese planejada pelo próprio artista. Em todos os trabalhos, temos a marca de um grupo de preocupações que se desdobram em frentes diversas. Inicialmente, um percurso em que a história da arte (isto é, o arquivo, a tradição) e o inesperado do tempo presente produzem um conjunto poderoso de ideias em cada obra planejada. Aqui, nada é gratuito, nem excessivo. Nelas, Gustavo está observando a materialidade industrial do nosso tempo através de uma rede de encontros e desencontros – ou, nas palavras que intitulam a exposição, de conluios e colisões.
Se a história da arte e as ruas são esses vetores de invenção do novo a partir de possíveis colisões na produção de “estranhos familiares”, é porque Gustavo acredita que não se trata de produzir novas formas ou reivindicar um estilo pessoal. Está tudo solto na plataforma do ar. Trata-se de colidir as coisas na criação de intervalos, pequenos deslocamentos cujas brechas (entre olho e reflexo, entre o concreto e o vidro, entre o consumo e a natureza) permitem a emergência de novos sentidos para o olhar – seu e nosso. Em “Turrell do Harlem”, por exemplo, a referência ao artista norte-americano (James Turrell), célebre por suas experiências com luzes, cores e espaços, é articulada fora do museu com a paisagem de tijolos de um prédio histórico do bairro nova-iorquino. Após mais de trezentas fotos registradas durante quatro anos (2013-2017), a repetição do vazio entre os prédios desloca a referência física (o espaço) em prol da flutuação lúdica da luz (o tempo). O vão ganha densidade quando retemos a referência de Turrell em nossos olhos. Dobrando a aposta do artista em tensionar espaços expositivos institucionais, a pesquisa de Gustavo nos faz ver na paisagem cotidiana aquilo que a arte simula.
Esse processo de aproximar por arestas, de atritar superfícies, pode ser visto também em suas esculturas metálicas, da série batizada de “Measure of Dispersion”. Já no título, Gustavo novamente privilegia essas sobreposições cujos contatos ativam uma fricção, A medida da dispersão, isto é, o cálculo daquilo que se perde, pode ser ampliado para situações em que múltiplos espelhos (a medida) provocam o desmonte do olhar (a dispersão). Seja de que perspectiva nos aproximemos delas, automaticamente a perdemos. No espelhamento com o mundo, o que olhamos passa, de alguma forma, a olhar para além de nós. Seus materiais polidos, impecáveis, fazem com que, novamente, o arquivo indique um minimalismo em cada peça. Mas eis que a colisão e o intervalo se instalam: seus materiais são automotivos, produtos industriais ordinários, deslocados para um tipo de apresentação cujo acabamento ilude e adensa os sentidos.
E quando a história da arte, mais do que referência, é a própria materialidade para se aplicar um método de conluios e colisões? Ao utilizar a clássica tela de José Ribera, “Martírio de San Felipe” (1629), Gustavo perfura sua solene cena religiosa e indica que algo ali, na sua visão, não cumpre o esperado. É quando o olhar do santo vacila em uma cena de abandono e solidão. Sua condição naturalista de homem do povo, além disso, é rasurada pelo grid moderno que define a montagem – tão barroca quanto o motivo da pintura – feita por milhares de peças de lego. A sobreposição – novamente, a colisão – entre a iconografia sagrada e a superfície lúdica transforma o martírio sem redenção e, citando o próprio artista, interrompe a possibilidade de uma convicção. Seu desejo em friccionar tais materiais só reforça essa busca por intervalos que expandem nossas leituras. Se há algo “mínimo” no trabalho de Gustavo Prado são suas estratégias. Um mínimo cuja eficácia atinge muitas vezes força máxima. Seja em vídeo, fotografia, esculturas ou telas, vemos nesta exposição o olhar de um colecionador de “traumas” materiais e brechas semânticas. Seu trabalho, visto em conjunto, chama a atenção para algo central em nossos dias: a falha. Seus olhos buscam nervuras em que, mais do que a semelhança, o que se vê são familiaridades simbólicas. Aproximações. Sem precisar limpar arestas, sem reivindicar purezas formais, Gustavo experimenta as coisas que encontra no mundo guiado por suas ideias sobre arte, design, cidade, vida. Como em seus carros batidos, cada diferença mínima só aumenta a ilusão de serem os mesmos. Uma trajetória em que seus trabalhos, como os reflexos, não garantam a unidade da imagem e dispersam o mundo em simultaneidades e diferenças. Ao constatar a falha, Gustavo liberta nosso olhar para aquilo que podemos ver, mesmo quando não vemos.
Fred Coelho possui graduação em História pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1994-1999), Mestrado em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1999-2001) e Doutorado em Literatura Brasileira pela PUC-Rio (2004-2008) com Bolsa-Sanduíche da Capes por um ano na New York University (2006). Entre 2001 e 2009 foi pesquisador do Núcleo de Estudos Musicais (NUM) da Universidade Cândido Mendes e pesquisador do NELIM (Núcleo de Estudos de Literatura e Música) da PUC-Rio entre 2009 e 2012. Tem experiência nas áreas de História, Literatura e Artes Visuais, com ênfase em cultura brasileira, atuando principalmente nos seguintes temas: história cultural brasileira, pensamento crítico brasileiro, música popular, memória e práticas culturais, arquivo e literatura, artes visuais e literatura, Modernismo brasileiro, Tropicalismo, Hélio Oiticica, e cultura marginal. Publicou diversos livros, artigos e obras organizadas. Além disso, trabalhou como pesquisador e redator (ou roteirista) para documentários, séries televisivas, sítios eletrônicos, editoras e instituições culturais. Entre 2008 e 2010 atuou como colaborador na coordenação dos cursos do Pólo de Pensamento Contemporâneo do Rio de Janeiro. Em 2009 tornou-se curador-assistente de artes visuais do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM-RJ), onde ficou até julho de 2011 trabalhando com Luiz Camillo Osório. Desde agosto de 2014, é Professor Assistente dos cursos de Literatura e Artes Cênicas e da Pós-Graduação em Literatura, Cultura e Contemporaneidade (PPGLCC) do Departamento de Letras da PUC-Rio. Atualmente é coordenador da pós-graduação lato-sensu Formação do Escritor (Departamento de Letras PUC-Rio/CCE) e Co-coordenador do PPGLCC.